I
Estava
preocupada. Para além da questão da autoafirmação ou da autoestima, estava a
questão das condições materiais de vida (que, em alguma medida, garantia parte
das condições simbólicas da existência existencial), ainda que tivesse que
dizer que, acima de tudo e de todos, seu objetivo único e principal era (ou seria!?)
garantir a satisfação e superar as expectativas do cliente. Inegavelmente,
quando estivesse falando para a empresa, a finalidade última era vender,
preferencial mas não necessariamente deixando a clientela satisfeita. Coisas da
vida, coisas devida...
Estava
preocupada. Precisava vender. Após algum tempo longe do palco, como seria sua
atuação diante das luzes da ribalta?
II
‘Como
vovó já dizia’, a melhor defesa às vezes é um excelente ataque. Mas, em dados
casos, o melhor ataque pode ser uma infalível defesa. Ambiguidades linguais...
coisas da vida: ambígua...
III
Chegado
o momento, vestiu a fantasia, ajeitou a máscara, incorporou a personagem e entrou
em cena. Regaçô! Detonô! Arrasô!
Vendeu
tanto, tanto vendeu, que necessário foi importar mercadorias. Até para ditos
mendigos, pessoas em situação de rua, finadas ou pessoas em outras condições
desafiadoras ela vendeu rodantes. O negócio era olhar pro copo meio vazio e
fazer de conta que estava meio cheio... E estava.
IV
Com
essa façanha, a cidade passou a ser mais viva, sorridente! Até os cavalos
ganharam com isso, pois foram alforriados, já que não mais havia carroceiros na
cidade: todos motorizados... Foram criados empregos nas áreas de assistência
técnica, venda de acessórios, combustíveis etc. Quase todo mundo estava se sentindo, na média,
crasse auta!
Mas, aí surgiu um problema, previsível, porém, enquanto possível, ignorável: as pessoas não mais podiam transitar com seus rodantes, pois não havia espaço para tantos carros. Nem mesmo nas larguíssimas avenidas batizadas com pomposos nomes indígenas era possível transitar motorizadamente.
Na
análise de alguns ex-pecialistas, o trânsito da cidade Emquestão poderia ser
comparado ao de São Paulo, ressalvado, evidentemente, o fato de que Emquestão tinha
um diferencial em relação não só a São Paulo, mas ao Universo: ainda oferecia
serviço de Orkut! Emquestão passou a ser a cidade com o maior número – em
termos absolutos e relativos – de rodantes do Planeta Galáxia.
V
Mas,
num dado momento, ela chegara a um impasse: não mais tinha como satisfazer,
menos ainda, superar as expectativas dos clientes, pois o fato de possuir o
carro não implicava necessariamente a possibilidade de transitar com eles pelos
logradouros de Emquestão. Mas, para a empresa, isso não interessava, não era um
argumento válido. O que interessava era que os índices de venda dela –
vendedora – aumentassem ou, ao menos, fossem mantidos.
Mas,
como conseguir isso? Criatividade, inegavelmente, com ética, evidentemente! –
conclui ela. Mãos àbobra...
PROMOÇÃO
DE ANO NOVO: Clientes que comprassem carro com ela teriam prioridade garantida
no trânsito e ganhariam ruas particulares para poderem trafegar sem os
incômodos inerentes aos dilemas de mobilidade urbana enfrentados por
megacidades, como Emquestão. Palavra de escoteiro! Ou melhor, de vendedor! (Deixemos
o pescador fora disso!)
VI
Desafio
vencido. Ainda sabia atuar e, se necessário, encenar. No grande teatro da vida
isso é vital.
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