I
Na escola os
professores lhe ensinam, desde a Educação Infantil, sobre a importância e a
necessidade de se ter uma “família estruturada”, a “verdadeira família”, a
“família abençoada”. Fizeram até uma atividade interdisciplinar (matemática + língua
portuguesa) na escola: “família estruturada = família abençoada”.
II
Sua mãe morreu
durante o parto do irmão mais novo. Seu pai precisou ir para outro Estado, em
busca de emprego, não encontrado. Por isso, o guri morava com a avó, “mãe
solteira”.
III
Isso não era uma
“família estruturada”, a “verdadeira família”, a “família abençoada”. E isso,
segundo os professores, é muito importante, uma imprescindível necessidade
necessária. Isso era motivo de muita vergonha, pois ele não tinha aquilo. Mas, o
que fazer? Como consegui-lo?
IV
Ficou, durante dias,
a matutar: como conseguir? Como conseguir isso? Como conseguir aquilo? O pai
provavelmente não mais voltaria, e mesmo que voltasse... A mãe certamente não
iria voltar, pois “Morte não tem volta”. “Morte não tem volta”. Ficou muito
triste. Angustiado. Desesperançado, o que é pior do que desesperado.
V
Passou a madrugada
tentando ligar para o CVV, mas não conseguiu. “Morte não tem volta”. Agora não
sentiria mais vergonha. Agora não sentiria mais vergonha. “Morte não tem
volta”.
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