SEM
TENSA
Ela foi. Alegre e esperançosamente: tensa?
Pretensa? Propensa? A pensar. Pior, melhor. Melhor, pior. Tristeza, alegria. Esperança,
desespero. Linha lindeira imaginariamente tênue. Tenuemente inimaginável. Naquele
momento, qual o limiar entre sensações ou sentimentos antitéticos? Qual a
relação entre ambos? Ambiguidade ambígua? Antinomia completamente complementante?
O caminho, desertos verdes. Mas não se
sente desertificada. No caminho, alonguecido, quilômetros que se triplicaram e
se transformam em milhas. Estilo Verne invertido, oitenta voltas ao mundo em
frações de um único dia. O pensamento segue, persegue, prossegue dickenseando:
“Pior dos tempos”? “Melhor dos tempos”? O tempo dirá, talvez.
Chegou. Encaminhou-se para a sala de
espera. A espera, à espera, uma eternidade. Um momento de um dia “1968”, à Zuenir
Ventura, “o ano que não terminou”. Evidência da relatividade do tempo –
absolutamente relativo, indiferente aos ponteiros digitais do cronômetro analógico:
esperar, ser esperado. O que se não espera quando se está “À espera de um milagre”?
Vem o chamado. O médico abre a porta.
As mãos. O envelope. A boca. Agora vem o resultado. “Sem tensa”, pensou ela. Ele
diz bom dia. Ela mede tudo, dos móveis aos trejeitos e entonação daquele ser
humano a sua frente. Preferiria, talvez, um humano ser? Ela busca qualquer
indício que possa lhe dar pistas para inferências certeiras. Aplicação do paradigma
indiciário guinzburguiano pra dar um fim a essa macro micro história que deverá
ser, no máximo, de curtíssima duração.
Ouviu atentamente as explicações sobre o
resultado do exame. “Sem tensa”, pensou ela. Mas, foi como se recebesse uma
rosa. Uma “Rosa de Hiroshima”. Vivera, naquele momento daquele dia, o seu
momento de “Um dia depois de amanhã”.
Depois disso, observou, em diferentes
locais e momentos, uma espécie de deseconomia de “trocas simbólicas”. Além de
palavras complacentes e de olhares condolentes, viu circular, nessa enconconomia,
um carimbado livro de heteroajuda. Leu apenas o título na capa e já inferiu
todo o conteúdo do livro, até as referências: “Agradecer e rir”.
“Agradecer e rir... uma ova!” –
pensentenciou! Ela não iria, nessa economia, sequer em metapensamento, encenar
“contra-dom” numa pretensa caricatura de “Ensaio sobre a dádiva”. Nessa relação
optou pela inadimplência, pela insolvência: ficaria, sem dúvida, com a dívida.
Incorporou uma personagem que, até
então, com base nas lembranças das quais se lembrava, nunca havia encenado.
Decidida, decidiu: iria “Até o limite da honra”! Aliás, iria para além de
qualquer pseudo limite. Faria de tudo isso uma espécie de sua “A última grande
lição”! Tinha nobres razões para isso.
Seria diretora-atriz dum filme, seria escritora-protagonista
dum livro. Mas não de qualquer livro ou
de um filme qualquer. Estes seriam referentes, ou melhor, seriam a sua própria
vida. Viveria, literalmente, sempre um dia depois do amanhã, de cada amanhã, amanhãs
sempre precedidos de um ontem e predecessores de um novo amanhã ser.
Ser familial – em incertas ocasiões –
tem seus ônus. Bônus. Percalços. Desafios. Fio da navalha. Fio da meada. Como
disse Mahnna Fran, trata-se de um negócio “da família”, de família, estilo
“burro Policarpo”.
Essa história de negócio familial já
lhe era familiar. Tinha longa experiência como doula em partidas com fórceps. Ela
tiraria de letra essa história. Na moral, na Moraes, as iniciais – se criptografadas
em inglês – corroboram isso: AID. Sem
tensa!
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