Ano novo. Tradicionalmente, pedidos de
“boas festas”, “ano bom” e outras expressões sinônimas de: “me dá um trocado”,
às vezes complementados com explicativas do provável ou possível uso do
dinheiro.
Quando alguém lhe pedia um “trocado”, ela
tinha vontade de dar um trocado de direita, mas não o fazia por questões
higienistas.
Era tradição. Era tradicional.
Naquele ano novo, de novo [,] só os novos
problemas. Problemas daqui. Problemas de lá. Problemas dacolá. Tava a fim de
esganar um, uma dúzia, um milhão de pescoços.
Parou no semáforo. Uma guria aproxima-se
do carro blindado para fazer o tradicional pedido. Algo naquela garota fez com
que lhe viesse à mente a imagem da própria filha. Não sabia o porquê, mas o
sangue ferveu.
“Tia, me dá boas festas? Quero comprar balas...”
“Ah!, você quer balas?”
Pegou o Magão 357 e deu duas balas
dum-dum pra guria, direto na boca. Atendeu, literalmente, o pedido daquela
criatura. ‘Seja feita a sua vontade’, pensou.
Durante o restante do caminho foi
repassando seu sermão “Sobre a caridade”. Sermão de ano novo, com tom de
esperança, de renovação. Desceu do carro. Concertou a indumentária. Limpou a
garganta. Fez o habitual sinal ritual antes de pisar a escada. Subiu no
separado e começou: “Qual é O PAI que,
pedindo o filho um pão, dará uma pedra?” fez um silêncio prolongado, técnica
que sempre utilizava para impactar emocionalmente seus seletos auditórios.
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