Era sabido, há
tempos, que a situação de uma parcela significativa de estudantes que estavam
ingressando no ensino superior apresentava muitas dificuldades na leitura e na escrita,
desde correspondência grafema-fonema, passando por dificuldades de pontuação,
hipo e hipersegmentação, até dificuldades – quando não impossibilidades – de
interpretação de textos, orais ou escritos. Dificuldades é um eufemismo
eufêmico para esta situação.
Aquela sala de um curso de licenciatura
era composta majoritariamente por pessoas com dificuldades incomensuráveis de
escrita e leitura, o que não é uma exclusividade das licenciaturas. E, para
quem não sabe ler, um pingo é só um pingo, isso quando o pingo é percebido.
Mas, pode(ria) um pingo ser um i, uma parte do ponto e vírgula, a metade de
dois pontos, um ponto ou mesmo um quarto de um i. Afinal, um pingo poderia ser
qualquer coisa, até um pingo.
Aula de alguma disciplina
relacionada a políticas educacionais. A professora chega e encontra a sala de
aula em pleno alvoroço, polvorosa. Não entendeu nada. O que estaria havendo?
Cadeiravoaço? Ocupação? Greve? Briga? Assembleia? Protesto? Treta pendente de
outras não vividas?
Percebeu que o tema em questão era
Paulo Freire. A sala toda estava brava com o ‘cavaleiro da esperança’. Queriam
exumá-lo para acertar as contas com ele. Por que tudo isso? O que o velho
mestre teria feito de errado?
Criou coragem e entrou na sala.
Pediu, aos berros, um minuto de silêncio. E não era em homenagem ao personagem
em cena, mas, sim para saber o que estava acontecendo. Nos seus 60 anos de
experiência no magistério nunca vira uma sala de licenciatura cometer ofensas,
blasfemas heresias em relação ao velho mestre. O que está havendo?
- Profa, é o seguinte... saca só o
que esse mano escreve nesse livro (Professora sim, tia não), ói aqui, profa, vê
se pode, esse cara qué morrê, só pode sê. Na moral, nós, reunidas em
assembleia, deliberamos que esse livro vai pro index prohibitorum das liças. Quem
esse cara pensa que é? Como esse pessoinha ousa dizer ‘professora Cyntia, não’.
Nós queremos a professora Cyntia sim e ponto final
Inconclusão: Era só uma questão de interpretação.
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