quinta-feira, 10 de agosto de 2017

sem tensa





SEM TENSA

Ela foi. Alegre e esperançosamente: tensa? Pretensa? Propensa? A pensar. Pior, melhor. Melhor, pior. Tristeza, alegria. Esperança, desespero. Linha lindeira imaginariamente tênue. Tenuemente inimaginável. Naquele momento, qual o limiar entre sensações ou sentimentos antitéticos? Qual a relação entre ambos? Ambiguidade ambígua? Antinomia completamente complementante?

O caminho, desertos verdes. Mas não se sente desertificada. No caminho, alonguecido, quilômetros que se triplicaram e se transformam em milhas. Estilo Verne invertido, oitenta voltas ao mundo em frações de um único dia. O pensamento segue, persegue, prossegue dickenseando: “Pior dos tempos”? “Melhor dos tempos”? O tempo dirá, talvez.

Chegou. Encaminhou-se para a sala de espera. A espera, à espera, uma eternidade. Um momento de um dia “1968”, à Zuenir Ventura, “o ano que não terminou”. Evidência da relatividade do tempo – absolutamente relativo, indiferente aos ponteiros digitais do cronômetro analógico: esperar, ser esperado. O que se não espera quando se está  “À espera de um milagre”?

Vem o chamado. O médico abre a porta. As mãos. O envelope. A boca. Agora vem o resultado. “Sem tensa”, pensou ela. Ele diz bom dia. Ela mede tudo, dos móveis aos trejeitos e entonação daquele ser humano a sua frente. Preferiria, talvez, um humano ser? Ela busca qualquer indício que possa lhe dar pistas para inferências certeiras. Aplicação do paradigma indiciário guinzburguiano pra dar um fim a essa macro micro história que deverá ser, no máximo, de curtíssima duração.

Ouviu atentamente as explicações sobre o resultado do exame. “Sem tensa”, pensou ela. Mas, foi como se recebesse uma rosa. Uma “Rosa de Hiroshima”. Vivera, naquele momento daquele dia, o seu momento de “Um dia depois de amanhã”.

Depois disso, observou, em diferentes locais e momentos, uma espécie de deseconomia de “trocas simbólicas”. Além de palavras complacentes e de olhares condolentes, viu circular, nessa enconconomia, um carimbado livro de heteroajuda. Leu apenas o título na capa e já inferiu todo o conteúdo do livro, até as referências: “Agradecer e rir”.

“Agradecer e rir... uma ova!” – pensentenciou! Ela não iria, nessa economia, sequer em metapensamento, encenar “contra-dom” numa pretensa caricatura de “Ensaio sobre a dádiva”. Nessa relação optou pela inadimplência, pela insolvência: ficaria, sem dúvida, com a dívida.

Incorporou uma personagem que, até então, com base nas lembranças das quais se lembrava, nunca havia encenado. Decidida, decidiu: iria “Até o limite da honra”! Aliás, iria para além de qualquer pseudo limite. Faria de tudo isso uma espécie de sua “A última grande lição”! Tinha nobres razões para isso.

Seria diretora-atriz dum filme, seria escritora-protagonista dum livro.  Mas não de qualquer livro ou de um filme qualquer. Estes seriam referentes, ou melhor, seriam a sua própria vida. Viveria, literalmente, sempre um dia depois do amanhã, de cada amanhã, amanhãs sempre precedidos de um ontem e predecessores de um novo amanhã ser.

Ser familial – em incertas ocasiões – tem seus ônus. Bônus. Percalços. Desafios. Fio da navalha. Fio da meada. Como disse Mahnna Fran, trata-se de um negócio “da família”, de família, estilo “burro Policarpo”.

Essa história de negócio familial já lhe era familiar. Tinha longa experiência como doula em partidas com fórceps. Ela tiraria de letra essa história. Na moral, na Moraes, as iniciais – se criptografadas em inglês – corroboram isso: AID. Sem tensa!




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